sábado, 6 de fevereiro de 2010

A educação: Instrumento de dominação ideológica (quarta parte)


Imagem: Nú com copos de leite - Diego Rivera (1944)

Por Adolfo Fernández Saínz, Prisioneiro político cubano, prisão de Canaleta em Ciego de Ávila.

Eu estudei até o nono grau no meu povoado natal, daí comecei o bacharelato fazendo viagens diárias à cidade de Pinar del Rio tal e qual haviam feito as gerações que me precederam. Num dia de provas finais dos anos setenta - para minha grande surpresa - fiquei sabendo que todos os alunos das zonas rurais uma vez que concluissem o sexto grau e com apenas doze anos, teriam que ser bolsistas forçosamente. Já não podiam estudar o secundário básico em seu próprio povoado como eu havia feito. Foram fechados também os institutos préuniversitários urbanos inclusive nas grandes cidades e os estudantes iam com bolsa de estudo para escolas recém construidas, longe de seus lares em lugares muito longínquos. Tratavam-se das chamadas ESBEC (escolas secundárias básicas no campo).

Aquilo foi uma esperiência muito traumática para a família cubana. Os pais viam com muita preocupação como seus filhos eram levados, como os perdiam de vista nesta idade tão dificil. Preocupavam-se especialmente com as meninas que eram controladas severamente e agora iam para longe em tão tenra idade. Foi um experimento totalmente desnecessário pois a maioria daqueles alunos já tinha uma escola e foram levados para outra nova. Ou seja, o propósito não era dotar de escola quem não tinha, o que teria sido muito louvável.

Não bastou aos comunistas educar todas as crianças, queriam fazê-lo além disso longe dos seus pais numa situação de isolamento. Não foi suficiente para eles manterem-nos quarenta e cinco dias em acampamentos de trabalho agrícola. Agora o sequestro era permanente. Os estudantes vinham de licença a cada duas semanas e no fim da semana seguinte os pais iam vistá-los em suas escolas, com as consequentes dificuldades de transporte até lugares afastados do centro urbano.

Este desatino sem nenhuma consideração com a família cubana, tinha entretanto um conceito muito diferente na propaganda oficial. Editaram um livro dedicado ao novo projeto "Revolução na Revolução", dedicaram-lhe também uma canção "A nova escola" de Silvio Rodríguez e até se chegou a dizer que "os outros países vão olhar para nós com inveja".

No princípio o adolescente se excitava com esse tipo de projeto que tinha algo de aventura, pois em certa idade o menino quer romper o laço que o ata a sua família, vínculo que ele vê por momentos como uma opressão. É uma etapa natural do nosso crescimento, porém em pouco tempo começavam as dificuldades, tinham saudades de casa, suas comodidades, porém notavam que era impossivel regressar. Começam então a fingir doença para que a família obtenha por qualquer modo um atestado médico que os autorize a abandonar a bolsa de estudos e voltem para uma escola urbana, das poucas que ficaram disponiveis para os que eram incompativeis com o regime interno por razões médicas.

Tornou-se costume a prática de mentir numa instituição oficial assistidos por um profissional de saúde que também se fazia cúmplice, porém todos fechavam os olhos pois partiam da lógica que tudo aquilo era um imenso disparate e que o adolescente, inocente de todo, não ia pagar pelos planos falidos. Alguns adoeciam dos nervos de verdade.

Se o propósito do ESBEC era econômico: dotar de mão de obra as grandes plantações de cítricos e outros cultivos, também por esse lado foi um grande fracasso, pois em nenhum momento se viu abundância de frutas ou outros produtos agrícolas. Os alunos deviam estudar num turno e trabalhar no outro. Outra prática que se tornou costumeira foi a de falsificar os informes produtivos. Se o aluno devia cumprir uma norma de trabalho agrícola, porém tinha pouco interêsse ou não se sentia entusiasmado para trabalhar, falsificava o dado ou o funcionário encarregado do campo - um camponês assalariado - aumentava o dado global. Nenhum país que chegou ao desenvolvimento pela via capitalista aplicou este sistema, tampouco nos antigos países socialistas. Toda a sustentação científica, pedagógica e ideológica para este mega experimento foi uma frase de Martí tirada do contexto, a que diz que o aluno deve "usar o livro pela manhã e a enxada a tarde".

Qualquer um se dava conta que aos meninos, sobretudo os das cidades, interessaria conhecer a vida de trablho no campo como parte de sua experiência de vida e se isso lhes despertasse a vocação, seria perfeito. Porém para conseguir esta aproximação ao mundo do trabalho não precisava por abaixo todo um sistema nacional que funcionava, baseado numa rede de escolas rurais e urbanas e com várias gerações acostumadas.



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